A importância do processo administrativo para a lide tributária

24/07/2014

Por Camila Mosna Tomazella

O Princípio do Devido Processo Legal, disposto em nosso texto constitucional em seu artigo 5º, LV, estabelece que é garantia de todos os litigantes, em processo administrativo ou judicial, a garantia do contraditório e da ampla defesa.

O processo administrativo[1], pouco utilizado pelos contribuintes – em comparação com o processo judicial, inicia-se através da cobrança do crédito tributário decorrente da atividade da Fazenda Pública – que tem por objetivo a constrição de dívida ativa, regularmente inscrita por autoridade competente, dotada de liquidez e certeza[2].

Detona-se, pois, que diferentemente do que ocorre no processo judicial, a administração pública não age no processo administrativo como terceiro estranho à controvérsia, mas sim como parte interessada, que atua em seu próprio interesse e nos limites que lhe são impostos por lei.

O processo administrativo fiscal só terá efetivo e formal existência se for promovido lançamento de tributo de forma regular nos limites estabelecidos pela legislação (artigos 201 a 204, do Código Tributário Nacional)[3].

Ademais, a administração pública deverá respeitar determinados princípios para que não haja qualquer ilegalidade no processo. Vale dizer, dispõe o artigo 37 da Constituição Federal que a administração pública, direta ou indireta, de qualquer dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência.

Em complemento ao texto constitucional, estabelece a Lei Federal nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999[4] que o processo administrativo deverá ser realizado sempre em concomitância com o Princípio da Legalidade, Finalidade, Motivação, Razoabilidade, Proporcionalidade, Moralidade, Ampla Defesa, Contraditório, Segurança Jurídica, Interesse Público e Eficiência.

Todas essas garantias trazem ao contribuinte maior segurança para a discussão de sua lide[5] na esfera administrativa. Obviamente tais pressupostos também devem ser encontrados em sede de processo judicial. Ocorre, contudo, que aliado a tais benesses o contribuinte possui um prazo maior de discussão de supostos valores devidos a título de tributos, bem como uma menor oneração.

Isso se deve em virtude de que para a discussão em sede administrativa não há necessidade de pagamento de custas processuais, não há condenação em honorários de sucumbência e não há necessidade de garantia do débito.

Ademais, assim que protocolizada defesa administrativa tempestivamente, há a imediata suspensão da exigibilidade dos créditos tributários em debate – que não podem ser inscritos em dívida ativa até o final do trâmite do processo administrativo.

As câmaras superiores que decidirão a lide sempre serão compostas por membros provenientes de entes fazendários (metade de seus membros) e por entes provenientes dos contribuintes (que compõem a outra metade). Tais conselheiros são escolhidos em face de seus elevados níveis de especialização e de conhecimento técnico em assuntos tributários.

Para o contribuinte, caso haja decisão improcedente de seu pedido, este poderá ainda discutir o referido caso em sede judicial. Tal benefício não é aplicado ao Fisco, que não poderá pleitear no Judiciário a revisão de decisões prolatadas no âmbito administrativo[6].

Atualmente vemos com frequência a utilização do processo administrativo nos casos onde a empresa não possui recursos financeiros para pagamento de débitos e aguarda a publicação de parcelamento pelo ente fazendário. Isso se deve, pois, considerando o atual cenário jurídico do país e o montante de casos aguardando julgamento, um processo administrativo que tramita pelas três instâncias, tem uma estimativa de duração de 03 a 05 anos; Já no âmbito Judiciário a estimativa é de mais aproximadamente 04 a 05 anos.

Ao todo, seriam aproximadamente 07 a 10 anos de espera do contribuinte até ter de fato a cobrança do suposto débito tributário.

Não podemos ignorar, contudo, que em virtude dos inúmeros benefícios que o contribuinte pode ter pelo trâmite do processo administrativo, este dado temporal deve ser considerado em segundo plano.

A possibilidade de ter seu caso julgado por profissionais especializados em cada seara do direito tributário, bem como o menor ônus financeiro ao contribuinte, devem ser considerados e alavancar a utilização de tal garantia constitucional.

A esfera administrativa está à disposição do cidadão como uma das formas de exercício do Princípio do Devido Processo Legal, amparado por todos os princípios supramencionados. A sua não utilização acarreta grande perda nas discussões tributárias,. O contribuinte, amparado por profissional qualificado para tanto, deve analisar caso a caso a sua viabilidade e seus benefícios.


[1] De acordo com o Dicionário Jurídico (in SILVA,De Plácido e; Vocábulo Jurídico / atualizadores Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009, p. 1.097) na técnica tributária, o processo administrativo designa o processo que tem relação com a determinação e exigência dos créditos tributários e sobre as consultas acerca da aplicação da legislação tributária. Iremos utilizar apenas no sentido de determinação e exigência dos créditos tributários.

[2] Cf. MELO, José Eduardo Soares de, in Processo Tributário Administrativo Federal, Estadual e Municipal, São Paulo, Quartier Latin, 2006, p. 53.

[3] Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular. Parágrafo único. A fluência de juros de mora não exclui, para os efeitos deste artigo, a liquidez do crédito.

Art. 202. O termo de inscrição da dívida ativa, autenticado pela autoridade competente, indicará obrigatoriamente: I – o nome do devedor e, sendo caso, o dos co-responsáveis, bem como, sempre que possível, o domicílio ou a residência de um e de outros; II – a quantia devida e a maneira de calcular os juros de mora acrescidos;  III – a origem e natureza do crédito, mencionada especificamente a disposição da lei em que seja fundado;  IV – a data em que foi inscrita;  V – sendo caso, o número do processo administrativo de que se originar o crédito.  Parágrafo único. A certidão conterá, além dos requisitos deste artigo, a indicação do livro e da folha da inscrição.

Art. 203. A omissão de quaisquer dos requisitos previstos no artigo anterior, ou o erro a eles relativo, são causas de nulidade da inscrição e do processo de cobrança dela decorrente, mas a nulidade poderá ser sanada até a decisão de primeira instância, mediante substituição da certidão nula, devolvido ao sujeito passivo, acusado ou interessado o prazo para defesa, que somente poderá versar sobre a parte modificada.

Art. 204. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída. Parágrafo único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite.

[4] Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

[5] A palavra aqui é utilizada no sentido dado pelo nobre jurista Francesco Carnelutti, vale dizer, Lide é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita.

[6] Em regra, o processo administrativo é operado ex officio. E a decisão que nele se pronuncia não tem caráter executivo nem gera coisa julgada. O processo administrativo tributário é exceção nesse sentido.

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