Lewandowski muda perfil da Corte

14/08/2014

Fonte: Valor Econômico | 14.08.2014
Por Juliano Basile

O ministro Ricardo Lewandowski foi eleito, ontem, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e, durante os dois anos de sua gestão, vai dar prioridade para resolver causas de massa. “Vamos priorizar os julgamentos dos recursos extraordinários com repercussão geral. São aqueles que aportam na Corte e sobrestam todos os demais que tratam do mesmo tema. Eles congestionam as cortes inferiores e fazem com que os jurisdicionados aguardem anos e anos para que a sua questão levada a juízo seja solucionada. Vamos dar prioridade para esses processos, sem esquecer as ações diretas de inconstitucionalidade que aguardam julgamento”, prometeu o ministro.

A escolha de Lewandowski seguiu um rito interno do STF pelo qual se torna presidente aquele que está há mais tempo no tribunal, mas nunca exerceu o cargo. Ele foi eleito por nove votos a um. Apesar de a eleição ser secreta, a tradição manda que o eleito presidente vote no vice. O único voto dissidente foi para Cármen Lúcia Antunes Rocha, que também foi eleita vice-presidente. “Prometo ser uma vice mineira, ou seja, quase invisível”, disse a ministra.

Lewandowski avaliou que o Judiciário precisa de soluções alternativas para reduzir a quantidade de processos. “Nós temos hoje 100 milhões de processos em tramitação no país para apenas 18 mil juízes. A razão da demora é a enorme litigiosidade”, afirmou. “Quando eu falo em formas alternativas, eu me refiro à conciliação, mediação e arbitragem de modo que os conflitos menores não sejam necessariamente levados ao Judiciário e sejam resolvidos pela própria sociedade.”

O ministro também prometeu dialogar com os demais poderes. “Nós faremos uma gestão de diálogo entre os Poderes e também com a advocacia e com o Ministério Público”, disse.

Os dois anos de Lewandowski à frente do Supremo devem ser marcados pelo perfil gerencial. A gestão de processos é uma obsessão do ministro desde que ele chegou ao STF, em 16 de março de 2006. Na ocasião, ele assumiu um gabinete com 12,5 mil processos. Dois anos depois, eram menos de quatro mil. O ministro foi o primeiro a obter um ISO 9001 para as práticas de solução de processos em seu gabinete. Ele costuma orientar a sua equipe a identificar causas por relevância tanto para a sociedade quanto para a redução de processos no Judiciário como um todo. Esses casos ganham prioridade.

No comando do plenário, o ministro deve fazer o mesmo, mas pretende conversar com os colegas de tribunal para organizar o cronograma de julgamentos de grandes causas. Se tiver sucesso nesse diálogo, Lewandowski poderá reinstituir a pauta organizada do tribunal pela qual todos sabem de antemão quais processos serão julgados mês a mês e, com isso, conseguem se preparar melhor para os julgamentos.

A pauta organizada foi inaugurada na gestão de Nelson Jobim no STF, entre 2004 e 2006, e representou uma revolução interna nos julgamentos. Nos últimos meses, apesar da divulgação da pauta com cinco dias de antecedência, muitos julgamentos, como o dos planos econômicos, foram suspensos no dia da sessão, o que passou a gerar imprevisibilidade sobre o que seria decidido.

Outra novidade na gestão de Lewandowski é o fim das quintas-feiras penais. Instituídas na gestão da ministra Ellen Gracie, entre 2006 e 2008, as quintas penais tiveram o objetivo de julgar um crescente número de ações em que políticos são réus e por tabela abrir espaço para encerrar com uma pecha negativa carregada pelo STF desde a promulgação da Constituição de 1988 – a de não ter condenado nenhum político até então. As sessões penais às quintas duraram até o primeiro semestre deste ano, quando o Supremo decidiu transferir os julgamentos penais para as duas turmas, onde votam apenas cinco ministros, em sessões feitas às terças-feiras. Agora, sob a gestão de Lewandowski, estão encerradas, o que abre espaço aos julgamentos de massa.

A condução serena dos julgamentos e a abertura para advogados e juízes também vai marcar uma diferença de Lewandowski com relação ao seu antecessor, Joaquim Barbosa. Enquanto Barbosa era avesso a receber advogados e a atender pedidos de associações de juízes, Lewandowski recebe bem ambas as categorias. Essa diferença ficou clara em junho, quando Barbosa mandou os seguranças do plenário retirarem o advogado de José Genoino que cobrava o julgamento de um pedido de prisão domiciliar para o ex-deputado federal condenado no mensalão.

Na semana seguinte, já sob a presidência interina de Lewandowski, um advogado pediu aos ministros do STF que julgassem um habeas corpus de seu cliente. Lewandowski agradeceu a intervenção e perguntou educadamente ao relator sobre a possibilidade de o caso ser julgado com agilidade. O ministro-relator disse que poderia fazê-lo e Lewandowski resolveu a questão, recebendo um “obrigado” do advogado.