Reestruturado, conselho deve retomar julgamentos em julho

11/06/2015

Fonte: Valor Econômico | 11.06.2015
Por Laura Ignácio

 

Com a publicação do novo regimento interno, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) deve retomar em julho os julgamentos de recursos de contribuintes contra autuações da Receita Federal. Essa é a expectativa do presidente do órgão, Carlos Alberto Barreto. A íntegra do texto está na edição de ontem do Diário Oficial das União.

Para que os trabalhos sejam retomados, o primeiro passo será a formação do novo Comitê de Acompanhamento, Avaliação e Seleção de Conselheiros (CSC), que terá que recompor o órgão. O Carf ficou desfalcado com a publicação do Decreto nº 8.441, que vetou a participação de conselheiros que advoguem contra a Fazenda. Desde a edição da norma, 90 integrantes, entre titulares e suplentes, renunciaram.

De acordo com Barreto, há uma agenda para o retorno às atividades ser feito “o mais brevemente possível”. “Estamos em constante diálogo com as entidades [representativas dos contribuintes] e, agora, dependemos das indicações”, disse o presidente do Carf. “Faremos a seleção dos novos conselheiros dentro do perfil agora exigido, compondo total ou parcialmente as turmas, para retomar os trabalhos em julho.”

A mudança no regimento interno foi anunciada no início de abril, pouco depois de deflagrada a Operação Zelotes. Por meio dela, a Polícia Federal investiga o suposto pagamento de propina a conselheiros para a obtenção de vitórias no órgão. A questão é relevante porque uma decisão final do Carf favorável ao contribuinte não pode ser contestada pela Fazenda na Justiça e, na esfera administrativa, tramitam causas cujo impacto para as empresas pode ser bilionário.

Perguntado se o intuito das mudanças no regimento é evitar novas investigações como a Zelotes, Barreto destacou que “o objetivo é conferir mais agilidade e segurança aos julgamentos do Carf”. O número de conselheiros, por exemplo, aumentou de seis para oito. “Isso também dará mais efetividade à jurisprudência do tribunal administrativo, que não ficará mais tão oscilante”, afirmou. Além disso, acrescentou, o debate terá mais ideias, “o que deverá contribuir para a qualidade das decisões”.

O presidente do Carf também citou o fortalecimento do comitê de seleção dos conselheiros. Ele será também responsável pela avaliação das atividades dos integrantes do conselho. “As linhas de avaliação ainda serão traçadas, mas já sabemos que a frequência de reuniões do comitê será maior e serão feitos relatórios trimestrais.”

O regimento interno foi alterado a partir de uma consulta pública. Segundo Barreto, nesta semana, serão divulgadas no site do Carf as justificativas para as propostas que não foram, total ou parcialmente, incorporadas.

Porém, para advogados, o novo regimento do Carf não traz grandes novidades em relação à minuta proposta pela própria Fazenda Nacional. O voto de desempate, por exemplo, continua sob responsabilidade dos representantes do Fisco. A alternância com representantes dos contribuintes era o pedido mais comum de advogados e entidades que representam empresas.

O maior número de conselheiros por turma é criticado pelo ex-conselheiro do Carf, Fabio Calcini, do Brasil Salomão & Matthes Advocacia. “Não creio que havia necessidade. Seis já permitiam um bom debate. Oito podem gerar mais lentidão para o julgamento”, disse. Contudo, acrescentou, ao diminuir o poder de cada conselheiro na decisão, dificulta-se possível caso de corrupção.

Calcini também criticou o fato de o mandato de três anos dos conselheiros ter sido reduzido para dois. Consequentemente, o conselheiro passa a ser reconduzido à função para permanecer no cargo por até seis anos, não mais nove. “Quando o profissional começar a amadurecer no cargo, familiarizado com a jurisprudência e procedimentos do órgão, o mandato acabará”, afirmou. Para ele, isso pode afetar a qualidade e celeridade dos julgamentos.

Das mudanças positivas, a mais comentada é a participação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Comitê de Acompanhamento, Avaliação e Seleção de Conselheiros. “A inclusão da OAB nesse comitê é uma importante vitória da advocacia, que garantirá a paridade e equilíbrio no órgão”, afirmou Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA). “Isso permitirá que os advogados também possam fazer suas indicações, em nome dos contribuintes.” Antes, só confederações representativas de categorias econômicas e centrais sindicais, além do Fisco, participavam desse processo.

A vedação à atuação de advogado, ao mesmo tempo, como conselheiro do órgão e tributarista foi reforçada. O texto deixa claro que é condição a apresentação de documento que comprove a licença do exercício da advocacia, o que independe de fiscalização da OAB. “Tudo isso é reflexo da Operação Zelotes para garantir a credibilidade do Carf”, disse o advogado Rodrigo Rigo Pinheiro, do BCBO Advogados. Para Pinheiro, pelas novas regras, é claro que o intuito do Ministério da Fazenda é ter maior controle sobre as atividades do conselho. “No sentido de evitar a corrupção no Carf, o balanço sobre o novo regimento é positivo.”